Entenda porque o Gran Turismo não é um simples esportivo.



O idioma italiano é maravilhoso, com suas sílabas ricas, melífluas, que rolam pela língua como vinho clássico, fazendo o mundo mundano parecer mágico, uma delícia descritível. Maserati Quattroporte parece um nome legal para um sedã de luxo imensamente carismático que alguém levou um tempão para encontrar. Na verdade, ele tem esse nome pelo que ele é: um carro de quatro portas. O mesmo se pode dizer do novo Maserati GranTurismo. Ele é, literalmente, um grã-turismo. Não é um carro esportivo.


Isso fica muito claro quando você joga o GranTurismo em uma estrada montanhosa. O motor V8 4,2-litros emite o agudo mais potente de um tenor, com um extremo metálico acima das 5.500 rpm, e manipular as borboletas de mudança de marcha garante trocas rápidas da caixa automática de seis velocidades no modo manual. Pressionar o botão “Sport” no painel aumenta a resposta de aceleração em 20%, endurece a suspensão significativamente e mantém o conversor de torque travado durante as trocas de marchas, que são 40% mais rápidas do que as normais. Mas um grande cupê Maserati não gosta de ser apressado. A sensação que ele transmite é de languidez. Em todos os sentidos.



Pode haver 400 cv sob o capô esculpido, mas eles não chegam a menos de vertiginosos 7.100 rpm e o torque máximo de 383 Nm não aparece antes de 4.750 rpm. Este motor é um gritador, mas ele tem de arrastar cerca de 1.979 kg de cupê de luxo com uma transmissão automática. Apesar de feito sobre uma plataforma de Quattroporte diminuída – 12,2 cm foram retirados do entreeixos, 6,6 deles perto do eixo traseiro –, o GranTurismo ainda é um carro grande, com o tamanho de um Mercedes-Benz Classe CL.


Os números do teste contam toda a história. A aceleração de 0 a 96 km/h levou 4,9 s, respeitável, mas de forma nenhuma impressionante nestes dias. O quarto de milha termina em 13,5 s com uma velocidade final de 167,4 km/h. O teste da figura oito leva 25 s, com uma média de aceleração lateral de 0,74 g. Um Pontiac G8 GT, que sai por um quarto do preço do GranTurismo, bate o cupê italiano em todas as provas com pelo menos 10% de vantagem.


Mas os dados de pista não mostram o quadro inteiro. Nas estradas de montanha, a combinação de um motor que gira forte e de uma transmissão automática significa que você não pode modular a aceleração para ter transferência de peso suficiente para o pneu traseiro externo nas curvas. Dirigir forte nelas é, por isso, um trabalho unidimensional, quase inteiramente dependente de o quão bem você escolhe frear e começar a esterçar o carro, e então tem de contar com a aderência dos grandes pneus Pirelli PZero (nosso carro de teste trazia US$ 2.900, cerca de R$ 4.600, em rodas de liga-leve de aro 20”).


O problema é que o pedal de freio transmite a sensação de que você está pisando em espuma de borracha num bloco de madeira. Estranhamente, na pista estes freios (com pinças pintadas na cor do titânio por US$ 600, ou quase R$ 1.000) se mostraram incríveis, gerando cinco paradas em menos de 31 m de 96 km/h a 0 em uma rápida sucessão. Mas você tem de subir no pedal de freio, e essa nem sempre é a melhor opção na estrada.


A direção, por outro lado, tira uma “siesta” toda vez que você puxa o lindo volante de madeira e couro (outro opcional, este por US$ 1.000, ou quase R$ 1.600) para fora do centro. Nas montanhas, fazendo pinball de tangente em tangente, é quase impossível posicionar o carro tão acertadamente nas entradas de curvas quanto você gostaria. A dianteira do GranTurismo também parece estar na ponta dos pés, assim como o cupê anterior da marca – e, na estrada, você está constantemente procurando a dianteira do carro, fazendo correções leves que são amplificados por uma certa folga na direção.

O peso grudento da direção, presumivelmente criado para tornar a dianteira do carro menos “passarinheira” na estrada, também acaba estrangulando qualquer resposta dos pneus Pirelli PZero da dianteira, tornando quase impossível julgar exatamente o que a frente do carro pretende fazer.


 Pegue pesado – pressione o GranTurismo como você faria com um Jaguar XKR, com um Corvette Z06 ou com um Porsche 911 – e ele se retrai em um sonolento subesterço, com o sistema de controle de estabilidade xingando baixinho. É melhor diminuir a força para uns 80% ou menos e seguir o fluxo normal da estrada. Freie mais cedo, e pegue uma tangente (se você puder encontrá-la, devido às largas colunas do pára-brisa), confie nos pneus para manter a velocidade na curva e tenha paciência antes de pisar no acelerador. Magicamente, você perceberá que o grande Maserati se acomoda em um ritmo, um compasso que pode não ser tão rápido quando você gostaria que fosse, mas que engana pela rapidez e pelo pouco esforço, relativamente falando. Em outras palavras, grã-turismo.


Os melhores aspectos do comportamento do carro serão amplamente acadêmicos, sem aplicação prática, para a maioria dos compradores norte-americanos de grã-turismos, de todo modo. É por isso que esse carro presta alguns de seus melhores serviços a apenas 40 km/h, rodando despreocupadamente por Beverly Hills, South Beach, pelos Hamptons e outras áreas inundadas por Mercedes-Benz Classe SL e BMW Série 6, oferecendo o prestígio de genuínos carros exóticos – Olha! Um Maserati! – por uma fração do preço de um Bentley Continental GT, de um Aston Martin DB9 ou de um Ferrari F430. Apesar dos horrores dos Biturbos “granada de mão” e dos modelos inspirados no Chrysler TC de Lee Iacocca, a história da Maserati nas competições dá à marca um charme de européia desencanada.

O GranTurismo é também um cupê surpreendentemente útil no dia-a-dia. Deixe que a transmissão se cuide sozinha, desligue o modo esportivo e o grande Maserati delizará do brunch ao campo de golfe e para o manobrista do melhor hotel da cidade com aquele toque saboroso de vigor italiano saindo do escape quádruplo quando você o acelera na saída do semáforo.

Entre os equipamentos de série estão um sistema de navegação por GPS (ainda que a interface do cupê não seja a mais intuitiva do mercado), sistema de som Bose com 11 alto-falantes e tudo elétrico. Ao contrário de outros modelos 2+2 que você possa imaginar – Jaguar XK, Bentley Continental GT, BMW Série 6 – ele realmente tem bancos traseiros que se pode usar (pessoas com mais de 1,80 m vão achar o teto muito baixo, mas, com meros 4 cm a menos que o fim do curso do banco dianteiro os passageiros do banco de trás já não precisam viajar com pernas abertas) e um bom porta-malas.


A decoração do interior é classicamente italiana – ninguém combina couro claro com carpete escuro melhor do que os italianos –, mas os detalhes traem que os orçamentos para desenvolvimento da Maserati não chegam perto dos disponíveis para Bentley e Audi. Detalhes como os cintos pretos que servem para todos os carros, as partes plásticas no centro do console e os espaços de rompimento em torno dos airbags no painel e nas portas (a Maserati não pode arcar com os custos de certificação de elementos que se rasgam para airbags que se abrem em velocidades diferentes para mercados diferentes).

Os predecessors deste carro, o Coupé e o GraSport, tinham desenho bem comunzinho. Isso foi enfaticamente corrigido. O GranTurismo é voluptuoso, sexy, lindo de morrer. Os quadris e a cintura lascivos dos Pininfarina colocam as curvas em todos os lugares certos nos esportivos, sem recorrer aos conscientes detalhes retrô dos Ferrari mais recentes. Ele tem caráter e uma presença nas ruas que faz cabeças virarem.

Estusiastas esperando por um esportivo ficarão desapontados com o GranTurismo. Ele precisa de mais potência e torque (ou de uma dieta). Ele precisa de uma direção mais precisa e de freios que se comuniquem melhor com o motorista (aliás, essa parece um bocado com a receita do vindouro GranTurismo S, que coloca uma transmissão manual com trocas no volante à disposição do condutor). Mas o GranTurismo é um carro tão encharcado de carisma que você quase pode perdoar suas falhas. Como um luxuoso cupê para a cidade, ele é uma alternativa distintiva dos Mercedes e Bentley que atualmente dominam o segmento. Mas não se esqueça: ele é um grã-turismo. Não um esportivo.

Traduzido: The New York Times Syndicate
Fotos: Raphael Valença.

Nenhum comentário:

Postar um comentário